Existem coisas que ninguém explica.
Existem coisas que ninguém sabe.
Pág. 219
Segundo livro do D’Avenia e ainda não consigo expressar em palavras a forma com a qual seus livros me marcam. Ele é uma artista das palavras. De maneira simples, ele disseca os personagens, extrai tudo o que pode deles e o resultado é uma erupção da vida como ela é, traduzida numa escrita elegante, sincera e apaixonada. Há metáforas maravilhosas, nessa história, e como o próprio autor explica, nossa alma precisa de metáforas porque o amor é cego.
A trama é baseada na vida da personagem central, Margherita. Uma jovem de apenas 14 anos que está para entrar no liceu (equivalente ao ensino médio) e, como toda jovem dessa idade, está com medo e insegura com o que o futuro lhe reserva. Como se apenas isso não bastasse, tem um outro baque: seu pai foi embora e ninguém sabe para onde. Ela não consegue aceitar, ela o quer de volta e isso servirá de base para o restante da história.
- E seus pais, o que eles fazem?- Eles se separaram – respondeu Margherita -, não fazem mais nada.Pág. 103
E é através de Margherita que vamos conhecer os outros personagens. A amiga da escola, Martha e sua numerosa família, incluindo gêmeas dançantes e uma animada mãe figurinista. Conheceremos, também, o excêntrico professor de italiano e latim, um apaixonado pelas letras que encontrou nos livros seu porto seguro. Ele se trancou com eles e esqueceu de se apaixonar pela vida... Ele quer incutir aos alunos o poder das palavras, através de Homero, e ao mesmo tempo fazê-los enxergar que os anos no Liceu serão cruciais para o restante de suas vidas, é quando eles precisarão tomar posse dela e escolher o próximo passo para o futuro. Pena que ele não aplica as mesmas regras para si.
Stella, namorada do professor, é outra personagem memorável. O relacionamento deles é um misto de fantasias. Eles conversam através de títulos de livros e quando chega a hora de finalmente pensar adiante, o professor se esconde. Ao passo que Stella é corajosa, ele é um covarde, tem medo do passo seguinte, medo de mudança, medo de sair do conforto.
Iremos conhecer Giulio, um adolescente (três anos mais velho que Margherita) desafortunado que foi criado por instituições de caridade e desde cedo aprendeu a roubar para ter o que queria. Mas, ao ver Margherita, resolve que precisa de um futuro melhor. O que ele mais gostaria era poder absorver toda a tristeza que emanava dos belos olhos dela. E ele precisava conhecê-la, já havia esperado tempo demais. Toda uma vida.
A avó de Margherita é como nossas avós, só carinho e pérolas de sabedoria. O pequeno irmão dela, também, é incrível; em seus dez anos, ele consegue enxergar mais verdades que muitos adultos e adora colecionar sabedoria do tipo “coisas que ninguém sabe”.
A narrativa de Alessandro D’Avenia é rica e profunda e, ao mesmo tempo, de uma sutileza comovente. Em Coisas que ninguém sabe (Bertrand Brasil, 378 páginas, R$ 39,00) ele escreve tudo junto e misturado. Ele muda a narrativa sem indicar o personagem e, apesar de estar misturado, o leitor consegue compreender perfeitamente quem está narrando aquele trecho, tamanho a força dos personagens.
Além da força, seus personagens têm fome (se você leu a trilogia Irmãos Wolfe - Markus Zusak -, e conheceu Cameron, saberá do que estou falando). Fome por aquilo que é grande. Fome pela vida.
A Bertrand Brasil lançou outro livro do D’Avenia, do tipo VOCÊ PRECISA LER. Branca como o leite, vermelha como o sangue, foi um dos melhores livros que li em 2011. O autor sempre deixa uma pegunta no ar, no livro anterior foi: O que faz seus olhos brilharem? Nesse, ele pergunta: Quando foi a última vez que você perdeu o sono pensando na vida que o espera? Quando?