“Somos o corpo régio, o esplendor longevo.”
Pág. 26
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Resenha by Laerte Lopes:
Este é o primeiro livro brasileiro que vou resenhar aqui no blog e fiquei muito feliz por ele ser bom. A história se passa em um mundo pós-apocalíptico onde quase toda a raça humana foi extinta. Um vírus (que não foi explicada a origem) assolou todas as formas de vida do planeta, exceto alguns humanos que não se contaminaram. Estes vivem em Domi, uma cidade planejada, auto-sustentável, que foi adaptada para aqueles que não se contaminaram.
A história tem um detalhe que para muitos pode ser chocante e esse detalhe foi o que chamou mais a minha atenção - você não suspeita disso quando está lendo o início -, a história dos Cultivados. Não tem como suspeitar e quando essa verdade vem à tona é que você vai ligar os pontos e talvez até se chocar com a história.
A leitura, em algumas partes, fica um pouco cansativa em conseqüência dos longos parágrafos e dos diálogos, que antecedidos de aspas, estão inseridos no parágrafo. Essa estrutura pode deixar o leitor confuso, é preciso prestar atenção e às vezes até voltar algumas linhas para não se perder. Destaco e admiro o rico vocabulário do autor e a sua escolha correta de palavras e ponto também na descrição simples e agilidade dos fatos que não permite a sonolência.
Eu gosto muito do tema (literatura distópica) e recomendo a leitura de Cultivados, de Rodrigo Baptista (Subtítulo, 172 páginas, R$ 29,90), só alerto para algumas cenas de brutalidade, cenas fortes mesmo. E é uma pena que o livro tenha apenas 172 páginas, você lê rapidinho e fica querendo mais. Mas fico pensando, é melhor ler 172 páginas de um bom livro do quê 300 de um chato. Talvez o Rodrigo Baptista tenha achado a quantidade de páginas suficiente para nos contar sobre a hecatombe criada por ele.
Agora, confira uma entrevista que o autor nos concedeu:
L.L - Gostaria de parabenizá-lo por sua estréia na literatura e pela boa história que criou, com um tema não muito popular no país. Fale-me sobre suas principais influências no desenvolvimento do seu livro, Cultivados.
R.B - Obrigado, é sempre um prazer saber que a obra está sendo lida e apreciada. Para construir Cultivados, tive diversas influências, tanto literárias quanto cinematográficas. Sempre quis que o livro possuísse ritmo e evoluísse constantemente na narrativa, sem enrolar nem enganar o leitor. Por isso, na época em que redigia, uma das inspirações foi a série Lost, apesar de a trama não possuir relação alguma. Tudo que acontecia possuía, teoricamente, uma razão. Procurei dar um significado a cada ação realizada, além de fazer o possível para conectar todos os pontos da trama (o que acabou não acontecendo na série, infelizmente). Um filme marcante também foi Blade Runner - O Caçador de Andróides, um dos primeiros que assisti em que era mostrado um mundo deturpado e corrompido. Já no âmbito literário, suguei um pouco de várias fontes. A Batalha do Apocalipse, de Eduardo Spohr, me mostrou que escrever uma obra está ao alcance de quem assim deseja, por exemplo. O vocabulário excepcional de Machado de Assis foi uma forte influência também. Acredito que palavras bem costuradas dão personalidade ao texto.
L.L - Pelo visto, você admira muito a literatura distópica. Quais livros desse estilo você mais gosta?
R.B - Sim, sem dúvidas. Sem a leitura de obras distópicas, Cultivados jamais teria sido concebido. Os mais marcantes para mim, apesar de óbvios, foram dois: 1984 e Laranja Mecânica. Laranja Mecânica me fisgou pela linguagem única; foi um livro diferente de qualquer outro que eu já tenha lido, tanto na forma quanto na trama. Já 1984 é uma das minhas obras favoritas, e que mudou a minha vida para melhor e para pior ao mesmo tempo. Foi ela que me mostrou a "magia" da distopia, a possibilidade de criar um mundo paranóico, minuciosamente controlado e repleto de ignorância. Mas mudou para pior exatamente por isso, por me fazer perceber que aquilo é um retrato exagerado do nosso próprio mundo. Após o término da leitura, passei a questionar diversos fatores da nossa sociedade: comportamentos, regras e maneirismos. E essa nova visão é um tanto quanto deprimente, na maior parte das vezes.
L.L - Você pretende escrever uma continuação de Cultivados?
R.B - É possível existir uma continuação ou um prequel para Cultivados, mas desde o início nunca foi a minha intenção continuar a história, apesar de já ter imaginado argumentos e roteiros pra um hipotético novo livro neste universo. Caso aconteça, será no futuro apenas. Hoje, trabalho em uma nova história que se passa em um contexto totalmente diferente, em que tive de fazer um trabalho de pesquisa detalhado antes de começar a escrever. É algo que foge desta linha distópica como conhecemos em vários termos, mas que agradará quem gostou de Cultivados, acredito.
L.L - Como foi lançar o livro de estréia numa Bienal?
R.B - Acho que "especial" é a palavra que define. Lançar um livro não é fácil. Conheço autores e mais autores que buscam emplacar uma publicação, mas não conseguem, apesar do talento visível. É um mercado difícil – como todos os outros – e a quantidade de novas obras chegando às editoras torna tudo mais complicado. Logo, estrear em uma Bienal do Livro dá um gosto único. Você sente o trabalho valorizado, pois vê as pessoas se interessando pela obra, mesmo com ela em meio a milhares de tantas outras. Foram dias inesquecíveis para mim. O problema é que acho que fiquei mimado. Vou querer que todos os meus livros sejam lançados em Bienais.
L.L - Assim como eu, vários autores desejam ver sua obra lançada por uma editora. Qual a sua palavra de incentivo?
Faça acontecer. Não deixe que bloqueios internos o impeçam de escrever ou de ousar em suas palavras. Confie em seu talento e uma vez iniciado o livro, vá até o fim. Procure não parar a obra para continuar depois, escreva todos os dias, se possível. Ler bastante é obrigatório – tanto por prazer quanto para pesquisa. Cada autor tem o seu método, mas se possível planeje o roteiro antes de começar a escrever, pois isso evita furos e pontas abertas no enredo. Não desanime se você não receber resposta imediata das editoras. Acontece com praticamente todos os autores iniciantes. Antes de conseguir publicar, criei um site (hoje desativado) para divulgar o livro. Existe meios para conseguir destaque, o importante é não desistir.
É isso, obrigado pela leitura e pelas perguntas. Um grande abraço!
L.L - Um grande abraço, desejo sucesso não só no livro Cultivados, mas em todos os próximos que você venha a escrever.
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E pra quem curtiu aí a premissa do livro “Cultivados”, ou pra quem já leu também, o blog Menina da Bahia em breve vai fazer uma promoção para sortear o livro. Fiquem ligados nas próximas semanas.