Resenha by Albarus Andreos
03/01/11
Aqui está um desafio titânico. Deparo-me com um livro enorme (A Guerra dos Tronos – Crônicas de Gelo e Fogo – Vol. 1. Editora Leya Brasil, 2010), um calhamaço de 592 páginas, apenas o primeiro de uma série de 5 (até o momento), já resenhado por pessoas muito bem preparadas e que elevaram o livro às alturas no Valhalla da literatura fantástica. Segundo a mídia deparamo-nos com o “Novo Tolkien” (coitado do George, não queria estar na pele dele, pois comparar alguém a Tolkien, muito mais que um elogio, é colocar um grau de exigência esmagador nas costas de alguém!). Isso tudo poderia dificultar um pouco a digestão pessoal desta obra, já que a influência externa pode contaminar uma boa leitura crítica, mas, alegremente declaro que sou uma pessoa pouco susceptível no que concerne a este tipo de influência. Quando falam tão bem de um livro, seja ele qual for, fico, sim, mais atento e com o espírito muito mais aguçado, à procura da qualidade propalada. Se ela está lá, não me nego a reconhecê-la, mas se não está, a propaganda enganosa me fará coceiras na mente que me incitarão azias críticas indizíveis... Não há nada pior que a má digestão de um texto, para um leitor crítico preparado! Portanto, armado de minha canetinha vermelha, vou começar minha tortura sangrenta para tentar denegrir ao máximo este autor tão metido a besta... Brincadeirinha!!!
O livro é um tesão, à primeira vista. Pesado demais, contudo. A capa é anos-luz melhor que da edição portuguesa da Leya. A diagramação deixa um pouquinho a desejar, já que os títulos dos capítulos usam fontes um tanto rebuscadas demais e imagino que outra fonte para o texto em si, mais elegante e moderna, facilitaria a leitura.
O mapa, como todo bom livro de fantasia, está lá. Um no início do livro e outro no final. Uma tática para dividir o Norte do Sul, do “Mundo”, onde se passa a história. Não gostei muito disso também, mas me parece a melhor escolha entre colocar tudo num mapa só (o que diminuiria demais os detalhes), ou colocar os dois mapas juntos, no início ou no fim (o que faz com que você tenha de folhear para ver onde está a informação que procura, se no primeiro ou no segundo, dos dois). Mas é apenas gosto pessoal. Mas os mapas são ruins, e isso já não é apenas questão de preferência minha, já que a todo o momento procuro alguma informação citada no texto e não encontro no Mapa. Cidades, nomes de topônimos e terras distantes são sumamente ignorados.
Bem, o livro... George R. R. Martin (G. R. R. Martin; mais uma vez remete-nos a J. R. R. Tolkien), escreve bem demais! A história, até o momento (estou na página 230, é absolutamente impecável no que concerne a pertinência, coesão e coerência. Os personagens são muitos, mas muito bem individualizados, já que cada um se comporta, fala, age e atua de forma bem definida e exclusiva em relação aos demais. É um show de como se escrever bem! Nada está li por acaso, pequenos detalhes são tudo! Como o fato de que, num certo trecho, a suspeita que recai sobre Tyrion Lannister, de ser o mandante no atentado a Bran Stark (difícil não soltar um spoiler aqui, portanto caia fora!), num determinado momento, parece incongruente com outra informação dada depois, quando os apostadores das justas do Torneio do Dia da Mão, dizem que “ganhariam o dobro” se o tal acusado estivesse ali para perder o dinheiro. Esta informação que nos parece um lapso do autor, mas depois se mostra genial, quando o próprio acusado diz peremptoriamente que “jamais apostaria contra alguém de sua própria família”, o que além de perfeitamente factível, é adequando ao caráter dele. Ou seja: não foi ele!!! É como no filme “O Sexto Sentido”, em que o moleque diz que “Vê gente morta” e não nos damos conta que ele já nos contou o final do filme e só percebemos isso quando o final chega mesmo. É muito bom! Ou Tyrion não teve nada a ver com o atentado ao jovem Stark ou está mentindo e vamos ser jogados mais uma vês numa reviravolta? Pelo que vi até aqui, sei que Martin saberá me ganhar, mais uma vez, seja qual for o desenlace. É isso que faz um autor ser bom. Ele ganha o leitor e o conduz respeitosamente e habilmente pelos caminhos traçados por suas linhas, palavra por palavra. Quando este diálogo se estabelece entre autor e leitor, temos o que se chama Literatura!
Tyrion é o melhor personagem do livro, em minha opinião! Engraçado, maldoso, arrogante, terno, generoso, desconcertante, inteligente... É o cerne da trama entre reinos e famílias invejosas, mesmo caminhando à parte da trama principal parece levar consigo segredos e desfechos para outros veios narrativos.
A história de G. R. R. Martin é a série de conspirações e intrigas por que passam poderosas famílias depois da derrubada de um antigo ditador por um novo rei, Robbert Baratheon. Foi auxiliado de perto por alguns cavaleiros próximos, dentre eles, o mais importante, está Eddard Stark, o senhor de Winterfell, a terra do norte, cheia de gelo e neve, fronteira com a Muralha, além da qual o mundo pertence a espíritos da floresta e assombrações desconhecidas. O clima da narrativa me assombra pela semelhança com o meu próprio livro “A Fome de Íbus”, iniciado com o Livro do Dentes-de-Sabre (Giz Editorial, 2009), é soturno, misterioso, cheio de reviravoltas e personagens redondos e factíveis. Há magia, cavaleiros, dragões (até agora só temos citações deles, mas eles existem!) e seres mágicos em profusão, mistérios a serem resolvidos e enigmas a serem desvendados. Muito bom!
Mas Martin não dá chance a sentimentalismos, ou convenções sociais, não tem dó de crianças e fala de sexo abertamente. Não é, portanto, um livro, estritamente falando, adequado para crianças. Os personagens podem ser os mocinhos agora, mas depois são capazes de vilanias e preconceitos que são absolutamente coerentes com aquelas gentes de um período medieval, classe social e situações específicas, como nos incita o livro.
Constrói com tijolos de fantasia, cimentando cada bloco com mistérios bem engendrados e reboca com brumas mágicas, sua literatura fantástica. Tirando o fato de que se trata de uma tradução do inglês para a literatura portuguesa, não tenho qualquer ressalva a fazer. E já que toquei nesse assunto, talvez tenha uma, sim. Vamos lá: A Leya é uma editora portuguesa e acha que um texto traduzido para o português de Portugal se adéqua bem ao português brasileiro. Deveria ter mais cuidado! Palavras como “carniceiro” (alcunha dada a um dos companheiros de esgrima de Arya, na primeira parte do livro), tem sentido totalmente diferente de “açougueiro”, que deveria ser a alcunha certa, nesse caso. Utilizando-se “carniceiro”, somos remetidos a características psicológicas que incitam determinado arquétipo totalmente despropositado; pelo menos é um personagem secundário demais para causar algum dano ao texto.
Se para um livro de Saramago isso não importa, deve-se levar em conta que os leitores de literatura fantástica não são, necessariamente, os mesmo de literatura Mainstream. A quantidade de palavras de difícil absorção pelo público brasileiro e seus empregos incomuns, como “castro”, “septo”, “auroque” etc. deveriam ser melhor substituídas por sinônimos mais familiares ao brasileiro, ou então o leitor comum daqui precisará de um dicionário por perto para poder aproveitar todo o texto, o que é algo ligeiramente incômodo. Nota 4 até aqui, só por esse motivo! Poderia ser 5 se fossemos falar apenas do trabalho do autor, mas infelizmente “alguém” apareceu para atrapalhar um pouco.
17/01/11
Numa entrevista que li sobre o porquê de Martin ter abandonado Hollywood, onde era roteirista de séries, ele disse que já não agüentava mais ter de cortar seus argumentos por ordens de algum executivo da indústria de filmes, por estarem longos demais. Decidiu escrever um livro onde não tem problemas com isso, ou com a quantidade de personagens. E vemos que Martin, para nosso proveito, fez a coisa certa.
Estou na página 371 e ainda fascinado pela escrita de Martin. Um livro enorme destes e não há encheção de lingüiça! Não há nada demais, sobrando ou cansativo. A parte onde Tyrion se encontra preso em Ninho das Águias, ou a emboscada a Ned, e ainda a conversa no leito após Robert voltar da caçada... Conteúdo de primeira, onde mestre Martin não deixa a bola cair nunca!
As frases tem o tamanho certo, com a força certa, com imagens absolutamente eficazes e diálogos precisos e adequados a cada arquétipo. Eddard Stark fala como alguém inteligente e íntegro; Tyrion com inteligência e esperteza e, no entanto, a relativa diferença entre eles os torna completamente desiguais em seus diálogos. Por um lago, Ned é prisioneiro de sua honra e outros sabem disso e usam esta vantagem contra ele. Tyrion já se mostra ácido e sarcástico como apenas alguém destituído de orgulho pela sua deficiência física pode ser. Ao mesmo tempo parece ter honra sob uma perspectiva própria e verdadeira. Personagens maravilhosos, reais, com os tons de cinza perfeitamente factíveis em uma pessoa real.
Cada personagem do livro foi feito para ser amado ou odiado, mas nem por isso os que amamos são anjos e os que odiamos são demônios. Não! Cada um traz consigo as complexidades do ser humano e nos colocam de um lado ou de outro na balança da aprovação ou da desaprovação de seus atos, como o sacolejar de uma carruagem que percorre uma estrada cheia de obstáculos, mas cujos cavalos não esmorecem e continuam puxando e puxando, de tal forma que não estacamos no caminho. Não, não é uma viagem fácil, mas Martin não pára e não demonstra fadiga, nunca! Conduz com maestria e, para ele, o caminho parece conhecido como um companheiro de viagem de anos e anos. Não, o caminho para nós é tumultuado, mas para ele é liso como o espelho de um lago, próximo a uma árvore-coração onde os antigos deuses, anteriores aos Sete trazidos pelos ândalos através do Mar Estreito, ainda permanecem em comunhão aos juncos, à terra escura e às borboletas. Dirige fácil e calmo e mesmo que estejamos absolutamente relutantes com o desconforto e a ansiedade, ele apenas mostra um fio de dentes, tanquilo e ciente de nossa inquietação. Ele tece o pano sem nós ou fios rompidos, suave como seda. Ele é o cocheiro, envolto em sombras sob o luar noturno numa terra fria e inóspita que só quando colocamos a cabeça janela afora nos permite um breve vislumbre intencional. É o responsável por cada sacolejo e por cada pedra que as rodas da carruagem superam e não adianta gritar lá de dentro da cabine para que diminua o ritmo. Na verdade, estamos adorando a jornada! Estamos assustados demais com a noite, maravilhados demais com a paisagem e ansiosos demais para saber onde o condutor nos levará.
09/02/2011
Livro terminado, achei um tanto estranho os dragões mamíferos do final, mas o livro é magnífico mesmo assim! A partir do terço final, Martin assume um papel diferente em sua narração e passa a falar pela boca de seus personagens, começando por seu personagem favorito (isso fica claro): Tyrion (que por acaso é o meu também).
Se no início do livro, o narrador mantinha-se anônimo e oculto, as opiniões que assume a partir do penúltimo capítulo de Tyrion é o de falar pelo personagem e assumir sua personalidade. Faz-se isso usando das palavras que próprio personagem usaria, se fosse a ele a narrar determinada circunstância. Assume-se seu gênio, sua índole, seu repertório e jeito de falar. Então, no último capítulo de Catelyn, Martin faz isso também. Isso mostra a adequação do escritor a um modelo mais confortável de narrativa.
O livro se aproxima da literatura fantástica que mais me agrada. Se já não fosse um livro soberbo, com as tramas dos palácios e das campanhas militares cheios de cavaleiros e espadas, o elemento mágico assume de vez quando Jon luta contra os mortos vivos, Drogo ressuscita e, como já falei, surgem os dragõezinhos.
Nota máxima! E que venha o segundo volume, que aguardarei ansiosamente!
Aqui está um desafio titânico. Deparo-me com um livro enorme (A Guerra dos Tronos – Crônicas de Gelo e Fogo – Vol. 1. Editora Leya Brasil, 2010), um calhamaço de 592 páginas, apenas o primeiro de uma série de 5 (até o momento), já resenhado por pessoas muito bem preparadas e que elevaram o livro às alturas no Valhalla da literatura fantástica. Segundo a mídia deparamo-nos com o “Novo Tolkien” (coitado do George, não queria estar na pele dele, pois comparar alguém a Tolkien, muito mais que um elogio, é colocar um grau de exigência esmagador nas costas de alguém!). Isso tudo poderia dificultar um pouco a digestão pessoal desta obra, já que a influência externa pode contaminar uma boa leitura crítica, mas, alegremente declaro que sou uma pessoa pouco susceptível no que concerne a este tipo de influência. Quando falam tão bem de um livro, seja ele qual for, fico, sim, mais atento e com o espírito muito mais aguçado, à procura da qualidade propalada. Se ela está lá, não me nego a reconhecê-la, mas se não está, a propaganda enganosa me fará coceiras na mente que me incitarão azias críticas indizíveis... Não há nada pior que a má digestão de um texto, para um leitor crítico preparado! Portanto, armado de minha canetinha vermelha, vou começar minha tortura sangrenta para tentar denegrir ao máximo este autor tão metido a besta... Brincadeirinha!!!
O livro é um tesão, à primeira vista. Pesado demais, contudo. A capa é anos-luz melhor que da edição portuguesa da Leya. A diagramação deixa um pouquinho a desejar, já que os títulos dos capítulos usam fontes um tanto rebuscadas demais e imagino que outra fonte para o texto em si, mais elegante e moderna, facilitaria a leitura.
O mapa, como todo bom livro de fantasia, está lá. Um no início do livro e outro no final. Uma tática para dividir o Norte do Sul, do “Mundo”, onde se passa a história. Não gostei muito disso também, mas me parece a melhor escolha entre colocar tudo num mapa só (o que diminuiria demais os detalhes), ou colocar os dois mapas juntos, no início ou no fim (o que faz com que você tenha de folhear para ver onde está a informação que procura, se no primeiro ou no segundo, dos dois). Mas é apenas gosto pessoal. Mas os mapas são ruins, e isso já não é apenas questão de preferência minha, já que a todo o momento procuro alguma informação citada no texto e não encontro no Mapa. Cidades, nomes de topônimos e terras distantes são sumamente ignorados.
Bem, o livro... George R. R. Martin (G. R. R. Martin; mais uma vez remete-nos a J. R. R. Tolkien), escreve bem demais! A história, até o momento (estou na página 230, é absolutamente impecável no que concerne a pertinência, coesão e coerência. Os personagens são muitos, mas muito bem individualizados, já que cada um se comporta, fala, age e atua de forma bem definida e exclusiva em relação aos demais. É um show de como se escrever bem! Nada está li por acaso, pequenos detalhes são tudo! Como o fato de que, num certo trecho, a suspeita que recai sobre Tyrion Lannister, de ser o mandante no atentado a Bran Stark (difícil não soltar um spoiler aqui, portanto caia fora!), num determinado momento, parece incongruente com outra informação dada depois, quando os apostadores das justas do Torneio do Dia da Mão, dizem que “ganhariam o dobro” se o tal acusado estivesse ali para perder o dinheiro. Esta informação que nos parece um lapso do autor, mas depois se mostra genial, quando o próprio acusado diz peremptoriamente que “jamais apostaria contra alguém de sua própria família”, o que além de perfeitamente factível, é adequando ao caráter dele. Ou seja: não foi ele!!! É como no filme “O Sexto Sentido”, em que o moleque diz que “Vê gente morta” e não nos damos conta que ele já nos contou o final do filme e só percebemos isso quando o final chega mesmo. É muito bom! Ou Tyrion não teve nada a ver com o atentado ao jovem Stark ou está mentindo e vamos ser jogados mais uma vês numa reviravolta? Pelo que vi até aqui, sei que Martin saberá me ganhar, mais uma vez, seja qual for o desenlace. É isso que faz um autor ser bom. Ele ganha o leitor e o conduz respeitosamente e habilmente pelos caminhos traçados por suas linhas, palavra por palavra. Quando este diálogo se estabelece entre autor e leitor, temos o que se chama Literatura!
Tyrion é o melhor personagem do livro, em minha opinião! Engraçado, maldoso, arrogante, terno, generoso, desconcertante, inteligente... É o cerne da trama entre reinos e famílias invejosas, mesmo caminhando à parte da trama principal parece levar consigo segredos e desfechos para outros veios narrativos.
A história de G. R. R. Martin é a série de conspirações e intrigas por que passam poderosas famílias depois da derrubada de um antigo ditador por um novo rei, Robbert Baratheon. Foi auxiliado de perto por alguns cavaleiros próximos, dentre eles, o mais importante, está Eddard Stark, o senhor de Winterfell, a terra do norte, cheia de gelo e neve, fronteira com a Muralha, além da qual o mundo pertence a espíritos da floresta e assombrações desconhecidas. O clima da narrativa me assombra pela semelhança com o meu próprio livro “A Fome de Íbus”, iniciado com o Livro do Dentes-de-Sabre (Giz Editorial, 2009), é soturno, misterioso, cheio de reviravoltas e personagens redondos e factíveis. Há magia, cavaleiros, dragões (até agora só temos citações deles, mas eles existem!) e seres mágicos em profusão, mistérios a serem resolvidos e enigmas a serem desvendados. Muito bom!
Mas Martin não dá chance a sentimentalismos, ou convenções sociais, não tem dó de crianças e fala de sexo abertamente. Não é, portanto, um livro, estritamente falando, adequado para crianças. Os personagens podem ser os mocinhos agora, mas depois são capazes de vilanias e preconceitos que são absolutamente coerentes com aquelas gentes de um período medieval, classe social e situações específicas, como nos incita o livro.
Constrói com tijolos de fantasia, cimentando cada bloco com mistérios bem engendrados e reboca com brumas mágicas, sua literatura fantástica. Tirando o fato de que se trata de uma tradução do inglês para a literatura portuguesa, não tenho qualquer ressalva a fazer. E já que toquei nesse assunto, talvez tenha uma, sim. Vamos lá: A Leya é uma editora portuguesa e acha que um texto traduzido para o português de Portugal se adéqua bem ao português brasileiro. Deveria ter mais cuidado! Palavras como “carniceiro” (alcunha dada a um dos companheiros de esgrima de Arya, na primeira parte do livro), tem sentido totalmente diferente de “açougueiro”, que deveria ser a alcunha certa, nesse caso. Utilizando-se “carniceiro”, somos remetidos a características psicológicas que incitam determinado arquétipo totalmente despropositado; pelo menos é um personagem secundário demais para causar algum dano ao texto.
Se para um livro de Saramago isso não importa, deve-se levar em conta que os leitores de literatura fantástica não são, necessariamente, os mesmo de literatura Mainstream. A quantidade de palavras de difícil absorção pelo público brasileiro e seus empregos incomuns, como “castro”, “septo”, “auroque” etc. deveriam ser melhor substituídas por sinônimos mais familiares ao brasileiro, ou então o leitor comum daqui precisará de um dicionário por perto para poder aproveitar todo o texto, o que é algo ligeiramente incômodo. Nota 4 até aqui, só por esse motivo! Poderia ser 5 se fossemos falar apenas do trabalho do autor, mas infelizmente “alguém” apareceu para atrapalhar um pouco.
17/01/11
Numa entrevista que li sobre o porquê de Martin ter abandonado Hollywood, onde era roteirista de séries, ele disse que já não agüentava mais ter de cortar seus argumentos por ordens de algum executivo da indústria de filmes, por estarem longos demais. Decidiu escrever um livro onde não tem problemas com isso, ou com a quantidade de personagens. E vemos que Martin, para nosso proveito, fez a coisa certa.
Estou na página 371 e ainda fascinado pela escrita de Martin. Um livro enorme destes e não há encheção de lingüiça! Não há nada demais, sobrando ou cansativo. A parte onde Tyrion se encontra preso em Ninho das Águias, ou a emboscada a Ned, e ainda a conversa no leito após Robert voltar da caçada... Conteúdo de primeira, onde mestre Martin não deixa a bola cair nunca!
As frases tem o tamanho certo, com a força certa, com imagens absolutamente eficazes e diálogos precisos e adequados a cada arquétipo. Eddard Stark fala como alguém inteligente e íntegro; Tyrion com inteligência e esperteza e, no entanto, a relativa diferença entre eles os torna completamente desiguais em seus diálogos. Por um lago, Ned é prisioneiro de sua honra e outros sabem disso e usam esta vantagem contra ele. Tyrion já se mostra ácido e sarcástico como apenas alguém destituído de orgulho pela sua deficiência física pode ser. Ao mesmo tempo parece ter honra sob uma perspectiva própria e verdadeira. Personagens maravilhosos, reais, com os tons de cinza perfeitamente factíveis em uma pessoa real.
Cada personagem do livro foi feito para ser amado ou odiado, mas nem por isso os que amamos são anjos e os que odiamos são demônios. Não! Cada um traz consigo as complexidades do ser humano e nos colocam de um lado ou de outro na balança da aprovação ou da desaprovação de seus atos, como o sacolejar de uma carruagem que percorre uma estrada cheia de obstáculos, mas cujos cavalos não esmorecem e continuam puxando e puxando, de tal forma que não estacamos no caminho. Não, não é uma viagem fácil, mas Martin não pára e não demonstra fadiga, nunca! Conduz com maestria e, para ele, o caminho parece conhecido como um companheiro de viagem de anos e anos. Não, o caminho para nós é tumultuado, mas para ele é liso como o espelho de um lago, próximo a uma árvore-coração onde os antigos deuses, anteriores aos Sete trazidos pelos ândalos através do Mar Estreito, ainda permanecem em comunhão aos juncos, à terra escura e às borboletas. Dirige fácil e calmo e mesmo que estejamos absolutamente relutantes com o desconforto e a ansiedade, ele apenas mostra um fio de dentes, tanquilo e ciente de nossa inquietação. Ele tece o pano sem nós ou fios rompidos, suave como seda. Ele é o cocheiro, envolto em sombras sob o luar noturno numa terra fria e inóspita que só quando colocamos a cabeça janela afora nos permite um breve vislumbre intencional. É o responsável por cada sacolejo e por cada pedra que as rodas da carruagem superam e não adianta gritar lá de dentro da cabine para que diminua o ritmo. Na verdade, estamos adorando a jornada! Estamos assustados demais com a noite, maravilhados demais com a paisagem e ansiosos demais para saber onde o condutor nos levará.
09/02/2011
Livro terminado, achei um tanto estranho os dragões mamíferos do final, mas o livro é magnífico mesmo assim! A partir do terço final, Martin assume um papel diferente em sua narração e passa a falar pela boca de seus personagens, começando por seu personagem favorito (isso fica claro): Tyrion (que por acaso é o meu também).
Se no início do livro, o narrador mantinha-se anônimo e oculto, as opiniões que assume a partir do penúltimo capítulo de Tyrion é o de falar pelo personagem e assumir sua personalidade. Faz-se isso usando das palavras que próprio personagem usaria, se fosse a ele a narrar determinada circunstância. Assume-se seu gênio, sua índole, seu repertório e jeito de falar. Então, no último capítulo de Catelyn, Martin faz isso também. Isso mostra a adequação do escritor a um modelo mais confortável de narrativa.
O livro se aproxima da literatura fantástica que mais me agrada. Se já não fosse um livro soberbo, com as tramas dos palácios e das campanhas militares cheios de cavaleiros e espadas, o elemento mágico assume de vez quando Jon luta contra os mortos vivos, Drogo ressuscita e, como já falei, surgem os dragõezinhos.
Nota máxima! E que venha o segundo volume, que aguardarei ansiosamente!
Série As Crônicas de Gelo e Fogo
1. A Guerra dos Tronos
2. A Fúria dos Reis
2. A Fúria dos Reis
3. A Storm of Swords
4. A Feast for Crows
5. A Dance with Dragons
4. A Feast for Crows
5. A Dance with Dragons
Uau hein! Com uma recomendação assim tão incisiva, como não querer ler?
ResponderExcluirBeijos!
Adoro essa série! Meus personagens preferidos foram Tyrion e Arya. Sem contar que os lobos são maravilhosos.
ResponderExcluirJá estou com A Furia dos Reis em mãos, agora só falta arrumar tempo para ler.
Excelente Resenha.
BJs
Tenho até medo, hahaha é muito gigante, mas tem cara de ser bom, um amigo esta lendo e diz que é impossivel não ler algumas páginas por dia!
ResponderExcluirBeijos
Uhm... Tenhos os tr~es volumes de Tolkien aqui, mas ainda não consegui ler... pego o livro e leio as primeiras páginas, mas não flui...
ResponderExcluirNão se gostaria de outro livro no mesmo estilo...
Mas, enfim, com recomendações tão entusiasmadas....
Otima resenha!
Bjão
Uau! E não é que a Nat publicou meu histórico de leitura na íntegra! É a primeira vez que escrevo no “Meninas da Bahia”, e mandei para a Natália o histórico que fiz no Skoob. É que prefiro muito mais este formato de histórico à simples resenha. No histórico podemos colocar nossas impressões até a página 50 e, na 100, de repente, podemos ter mudado de opinião. O histórico vai registrando isso, as mudanças de impressão, a evolução não só da história e do desempenho do autor, mas do leitor lendo a história. Pode-se ver as partes boas e as chochas, o subir e descer do ritmo e do desempenho dos personagens etc. Até me ofereci para fazer uma resenha mesmo, do livro do G. R. R. Martin, mas a visão da Nat foi mesmo igual a minha. Espero que todos os leitores deste blog tenham gostado embora seja muuuuito comprida e até por isso, devem ter notado minha paixão pelo livro, que certamente se revelará acertada por todo o resto da série. Lembrando que As Crônicas de Gelo e Fogo viraram série pelo HBO, que começa a ser exibida em breve. Não percam!
ResponderExcluirOi Nat,
ResponderExcluirFiquei morrendo de vontade de ler esse livro, mas o tamanho dele me assustou! Vou esperar pelo lançamento da série toda!! rs...
Beijos
Camila